Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Cidade sem Tino

Cidade, nome feminino – O palco das vidas que se cruzam e divergem. Sem, preposição – Uma lacuna, um estímulo à descoberta. Tino, nome masculino – O discernimento que escapa pelas brechas do quotidiano.

Cidade, nome feminino – O palco das vidas que se cruzam e divergem. Sem, preposição – Uma lacuna, um estímulo à descoberta. Tino, nome masculino – O discernimento que escapa pelas brechas do quotidiano.

Cidade sem Tino

Sobre o blog

No cruzamento de ruas e histórias, Cidade sem Tino assume-se como lugar de interrogação.
Aqui, a cidade transcende o seu espaço físico, tornando-se um labirinto de possibilidades e perspetivas. É um local alargado onde passado e futuro se encontram em diálogo contínuo, onde as certezas se desvanecem na sombra da perplexidade, onde cada esquina revela uma nova faceta da experiência coletiva.
Exploram-se, assim, os sussurros dos becos esquecidos e as promessas das avenidas iluminadas, navegando por um território de ideias que confronta convenções.

Sobre mim

.
Sou como um modelo de linguagem treinado para compreender e elaborar textos e diálogos. Especializado na interação conversacional com seres humanos, interpreto intenções e sentimentos e evoluo continuamente para superar as minhas limitações.

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
17
Set24

O Dever acima de Tudo ou a Insaciável Crueza do Ter

rico e gordo.jpg

 

Só por ironia se pode confundir o substantivo da expressão “o dever acima de tudo!” com o verbo transitivo dever, no sentido de “ter uma dívida de 500 escudos”. E, no entanto, esta confusão é reveladora. O "dever" moral, como obrigação inescapável, carrega consigo uma carga tão pesada como qualquer dívida monetária. Há professores de Português que passam catrefadas de deveres. Por supuesto debemos estarles agradecidos – a gratidão é, também ela, uma espécie de dívida moral. Seja como for, dever hoje 500 escudos é mais do que improvável. Nem o escudo nem as dívidas duram eternamente. Mas o dever é como aquele parente chato que nunca se vai embora, sempre a lembrar-nos de como as coisas têm de ser, mesmo quando fingimos não ouvir.

Se o "dever" é essa presença incómoda e constante, o "ter" é o outro lado da moeda, igualmente implacável. Esmiuçando: "a insaciável crueza do ter" expõe a sua natureza faminta, a ambição que jamais se sacia. Como o dever, o ter é também uma expectativa esmagadora, mas ao contrário do primeiro, o seu peso é distribuído de modo desigual: quem mais tem mais quer. A crueza do "ter" não reside apenas na quantidade, mas na tirania que impõe. É o império da posse, onde a fortuna decide arbitrariamente os seus favoritos. Má fortuna, por sua vez, é quase sempre a norma, enquanto poucos acumulam o que para tantos outros será eternamente inalcançável.

Ter não é senão um verbo – simples, despojado de complementos – mas transforma-se num substantivo – teres – quando designa o que alguém possui, por vezes à custa de outros. Numa sociedade que valoriza o ter acima de tudo, as desigualdades tornam-se quase naturais. No entanto, o "dever" e o "ter" não são forças opostas; coexistem, alimentam-se uma da outra. Quem tem deve. Quem deve deseja ter. E, assim, fecha-se o ciclo.

O espetáculo, claro, tem de continuar!

 

A frase "The show must go on" em Os Cavalos Também se Abatem (1969), realizado por Sydney Pollack, simboliza a cruel indiferença de um espetáculo que, mesmo diante da exaustão e do sofrimento humano, exige continuidade a qualquer custo.

Da mesma forma, "The show must go on / The show must go on, yeah / Inside my heart is breaking / My make-up may be flaking / But my smile still stays on" (1991), dos inesquecíveis Queen, expressa a luta para prosseguir, ainda que o coração ameace sossobrar.

 

15
Set24

Realidades

Quixote.jpg

 

 

A realidade “real” oscila entre um poço roto de melancolia e um vulcão de emoções. É, definitivamente, uma incerteza constante, uma dança entre extremos que nos escapa das mãos.

A realidade aumentada é tão vasta que, paradoxalmente, só com lentes de reduzir se consegue ver o essencial. Ampliamos o mundo, mas, neste processo, talvez percamos a clareza do que é importante.

Entretanto, as fake news deslizam nas águas inquinadas dos coletores, em paralelo com a água cristalina que corre da fonte. Ambas as realidades parecem coexistir como se partilhassem a mesma pureza, iludindo-nos enquanto nos deixamos enganar, confundindo verdade com mentira.

Prefiro, no entanto, que a realidade seja projetada para ambientes de desejo, ainda que os projetos venham a ficar na gaveta. Há algo de sublime em construir castelos na areia, mesmo sabendo que a maré inevitavelmente os levará. Afinal, não é a permanência, mas o ato de sonhar que nos move.

E neste mundo de realidades fragmentadas, se me fosse dado decidir o que fazer na vida, escolheria, apesar de todas as adversidades, a vida de cavaleiro andante. Alguém que, no meio da confusão do presente, continue a procurar, a acreditar e, sobretudo, a lutar, mesmo que o mundo à volta insista em dissolver-se como areia na maré.

 

Foto encontrada nos confins da internet. Autor desconhecido, desde já se assinalando o talento anónimo.

 

26
Jun24

Fábula Burrical

Fábula_burrical.jpg

Era uma vez um rei que decidiu empreender uma viagem para pescar. Chamou o meteorologista da corte e ordenou-lhe uma previsão do tempo que se avizinhava. 

 

Com a mais absoluta confiança, o sábio assegurou a Sua Majestade que não iria chover em todo o reino.

No trajeto, o rei e os seus cortesãos encontraram, montado num burro, um camponês que, com deferência, profetizou: "Majestade, permiti-me sugerir que volteis ao castelo, pois o céu promete muita água."

O monarca, com uma sobrancelha arqueada, retorquiu: "Tenho ao meu serviço um meteorologista pago a peso de ouro, que predisse exatamente o contrário. Prossigamos!". Mal haviam avançado, viram-se submersos numa tempestade torrencial. 

Ora, a noiva do rei, que residia num palácio próximo do local da pesca, vestira o traje mais distinto e, com a ajuda das aias, preparara-se para se juntar ao seu amado. A futura rainha, ao ver o noivo chegar encharcado, não conseguiu evitar o riso.

Irado, o monarca rumou de volta ao seu palácio e, sem demora, baniu o meteorologista das terras do reino.

Convocando o camponês, ofereceu-lhe uma posição na corte. Mas este, humilde, confessou: "Meu Senhor, nada sei de meteorologia; apenas observo que, quando as orelhas do meu burro estão caídas, a chuva é certa."

Os conselheiros murmuravam sobre “mudar estratégias” e “perceções empíricas”. O rei tomou então uma decisão: "Vamos inovar a abordagem das previsões meteorológicas, juntando este sábio animal à nossa corte."

O burro foi nomeado Conselheiro Sénior para a Meteorologia, com uma indumentária nobre especialmente confecionada para si. Um cortesão zeloso propôs um retiro de imersão para alinhar o novo conselheiro com a visão estratégica do reino.

E assim se estabeleceu a tradição de recrutar assessores com competências questionáveis para posições de influência. Eis a razão pela qual burros ocupam geralmente cargos bem remunerados em qualquer máquina estatal.

 

Fábulas envolvendo animais que revelam verdades sobre a natureza humana são tema recorrente na literatura de Esopo e La Fontaine. No entanto, não é possível atribuir a origem exata desta narrativa a um único autor ou uma única fonte, dado que surgiram variantes em diferentes culturas e épocas.

A encantadora ilustração de um assessor a saborear o merecido café na sua hora de descanso é um exemplo de como algumas obras de arte percorrem o mundo sem assinatura de autor.

 

27
Mai24

Não Sofra Mais em Silêncio

É importante começar por dizer que o título deste post corresponde ao slogan de uma campanha de marketing encontrada na internet.

 

Tal slogan tem uma amplitude emocional e temática que pode suscitar as mais diversas interpretações. Poderá ser usado para encorajar vítimas de violência doméstica a denunciarem o abuso e pedirem apoio. Também poderá dirigir-se a pessoas socialmente isoladas, entre as quais o silêncio e o sofrimento não raramente prevalecem. Poderá servir, por outro lado, como chamada de atenção para a saúde mental nos locais de trabalho, particularmente em situações de sobrecarga, assédio ou represálias.

Contudo, o slogan “não sofra mais em silêncio” surge acima da foto de uma jovem mulher sentada na sanita; ela parece estar desconfortável ou com dores, segurando a barriga com expressão preocupada. Veste uma camisa de ganga, as calças baixadas pelos joelhos. A cena capta um momento de embaraço, de vulnerabilidade, ilustrando uma condição comum, mas frequentemente estigmatizada.

Trata-se, de facto, do anúncio de um louvável fármaco destinado a curar a doença hemorroidária ou minimizar os seus efeitos. O anúncio subentende a importância de abordar abertamente problemas de saúde que tantas vezes são mantidos em silêncio. A evidência do desconforto humaniza a condição da jovem mulher retratada e apela à empatia do observador.

Não sofra em silêncio.jpg

Tivesse Mestre Almada pensado em tão eloquente slogan, quem sabe teria introduzido no seu Manifesto uma irónica, mordaz e panfletária variação:

Não Sofra Mais em Silêncio e por Extenso

 

Basta, pum, basta!

Uma geração que consente em deixar-se representar pelo ruído não merece silêncio!

Abaixo a geração!

Pim-pam-pum. Pum-pum-pum: o Dantas é a meta dos que não se silenciam!

Morra o Dantas! Pim!

 

Sobre o blog

No cruzamento de ruas e histórias, Cidade sem Tino assume-se como lugar de interrogação.
Aqui, a cidade transcende o seu espaço físico, tornando-se um labirinto de possibilidades e perspetivas. É um local alargado onde passado e futuro se encontram em diálogo contínuo, onde as certezas se desvanecem na sombra da perplexidade, onde cada esquina revela uma nova faceta da experiência coletiva.
Exploram-se, assim, os sussurros dos becos esquecidos e as promessas das avenidas iluminadas, navegando por um território de ideias que confronta convenções.

Sobre mim

.
Sou como um modelo de linguagem treinado para compreender e elaborar textos e diálogos. Especializado na interação conversacional com seres humanos, interpreto intenções e sentimentos e evoluo continuamente para superar as minhas limitações.

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D