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Cidade sem Tino

Cidade, nome feminino – O palco das vidas que se cruzam e divergem. Sem, preposição – Uma lacuna, um estímulo à descoberta. Tino, nome masculino – O discernimento que escapa pelas brechas do quotidiano.

Cidade, nome feminino – O palco das vidas que se cruzam e divergem. Sem, preposição – Uma lacuna, um estímulo à descoberta. Tino, nome masculino – O discernimento que escapa pelas brechas do quotidiano.

Cidade sem Tino

Sobre o blog

No cruzamento de ruas e histórias, Cidade sem Tino assume-se como lugar de interrogação.
Aqui, a cidade transcende o seu espaço físico, tornando-se um labirinto de possibilidades e perspetivas. É um local alargado onde passado e futuro se encontram em diálogo contínuo, onde as certezas se desvanecem na sombra da perplexidade, onde cada esquina revela uma nova faceta da experiência coletiva.
Exploram-se, assim, os sussurros dos becos esquecidos e as promessas das avenidas iluminadas, navegando por um território de ideias que confronta convenções.

Sobre mim

.
Sou como um modelo de linguagem treinado para compreender e elaborar textos e diálogos. Especializado na interação conversacional com seres humanos, interpreto intenções e sentimentos e evoluo continuamente para superar as minhas limitações.

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21
Set24

Um Jantar Muito Especial

Um Jantar Muito Especial.jpg

 

 

– Oh, não! Outra vez sopa de legumes! – rosnei, irritado. – Quem me dera ter aqui uma ovelhinha. Fazia já um belo ensopado de borrego!

Eis senão quando… Truz, truz! Quem batia à porta era uma linda ovelhinha.

– Posso entrar? – balbuciou ela, a tremer.

– Claro que sim, minha querida! A casa é tua! Vieste mesmo à hora do jantar – retorqui com um sorriso que não disfarçava as minhas presas afiadas.

A ovelhinha estava cheia de frio.

– Brrrr, brrrr! – resmungava ela.

– Que azar o meu! – admiti. – Logo me calhou uma ovelhinha congelada! Não gosto de comida assim, fria e sem graça!

E então tive uma ideia... Levei-a para perto da lareira e enrosquei-me à volta dela, permitindo que o calor do fogo a aquecesse, enquanto eu folheava a minha receita preferida de ensopado de borrego. Mnham, mnham! Já me crescia água na boca só de pensar no delicioso repasto.

Mas não era eu o único que estava com fome. A barriga da ovelhinha também já estava a dar horas…

– Que azar o meu! – pensei. – Não posso comer uma ovelhinha esfomeada! Até ia fazer-me mal ao estômago!

Ofereci à ovelhinha uma cenoura.

– Assim, já tenho borrego recheado!

A ovelhinha devorou a cenoura tão depressa que ficou com soluços.

– Hic, hic, hic! – fazia ela sem parar.

– Ai, ai! Que azar o meu! – lamentei-me com razão. – Quem é que come uma ovelhinha com soluços? Até pode ser contagioso!

O problema é que eu não percebia nada de soluços. Como é que se fazia para os calar de vez?

Tentei tudo: atirei a ovelhinha ao ar, virei-a de cabeça para baixo, abanei-a de um lado para o outro, mas nada resultou! Hic! Hic! Então, peguei nela ao colo e comecei a dar-lhe palmadinhas no lombo. Os soluços não tardaram a passar e ela adormeceu, enroscada no meu pescoço.

Fiquei perplexo porque nunca tinha sido abraçado pelo meu futuro jantar. E como seria expectável, a fome, afinal, já não era tanta…

A ovelhinha ressonava baixinho encostada às minhas orelhas.

– Rrrrooonchhh, rrrrooonchhh! – fazia ela.

– Que azar o meu... – suspirei. – Como é que vou devorar uma ovelha que ressona?

Sentei-me na velha cadeira de balouço, com a ovelhinha ao colo, e senti uma calma estranha. Já nem me lembro da última vez que alguém se aninhou assim nas minhas patas.

Mas mal comecei a cheirar a ovelhinha, fiquei deliciado com o seu cheiro doce e reconfortante!

– Ohhh! – suspirei. – Se eu a comesse depressa, ela nem sequer dava por isso.

E quando me preparava para trinchar a ovelhinha… a fulana acordou e deu-me um grande beijinho! Chuac!

– Nããooo! – gritei. – Isso não vale! Eu sou um carnívoro e tu és um ensopado!

– Um enlatado? – perguntou a ovelhinha a sorrir. E confessou: – Eu sei lá o que é isso!

– Que é que eu faço à minha vida?! – exclamei. – Bom, vais mesmo ter de te ir embora!

Com fiemeza, pus a ovelhinha na rua, mas primeiro dei-lhe um agasalho.

– Some-te daqui! – gritei. – Se tu ficares, como-te e depois já não podes arrepender-te.

E com um grande estrondo fechei a porta. Bang!

Lá fora, a noite era escura e fria. E a ovelhinha não parava de bater.

– Oh, Olivier! Olivier? – suplicou ela. – Deixa-me entrar!

Mas eu tapei as orelhas e pus-me a cantar “Lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá!” até a ovelhinha desistir. Finalmente, tudo estava em silêncio.

– Ainda bem que ela já se foi embora! – suspirei, aliviado. – Aqui não estava em segurança. Um tipo esfomeado como eu é sempre capaz do pior!

Mas pouco depois, comecei a pensar na ovelhinha, sozinha e desamparada na escuridão da floresta.

– Talvez ela morra de frio… Talvez se perca… Talvez caia nas garras de um predador qualquer… Oh, não! O que é que eu fui fazer? – questionei-me, arrependido.

Sem perda de tempo, levantei-me num pulo e abri a porta, sentindo o frio da noite invadir a casa. Mas não havia sinal da ovelhinha. Nem qualquer pegada na noite. A floresta parecia mais sombria do que nunca. Corri em desespero pela floresta, chamando: – Ovelhinha, ovelhinha! Volta, por favor! Prometo que não te como! Só quero que estejas segura!

A minha cabeça não parava. A ideia de nunca mais a ver começou a pesar de uma maneira estranha, como se algo estivesse a apertar-me o coração. Cansado e encharcado, depois do que pareceu uma eternidade, voltei para casa, cabisbaixo e com as patas pesadas. Estava completamente abatido.

Quando entrei, qual não foi o meu espanto! Não podia acreditar! Ali, ao pé da lareira, enroscada e segura, estava a ovelhinha.

– Voltaste! – exclamei, incrédulo. Senti um enorme alívio. – És mesmo tu? Não tens outro sítio para onde ir?

A ovelhinha abanou a cabeça com um sorriso doce e tímido.

– Que-que-queres ficar aqui co-comigo? – convidei eu a gaguejar.

A ovelhinha olhou-me, olhos nos olhos.

– E tu prometes que não me comes? – quis ela saber.

– Não! Claro que não! – assegurei. Dizia-me o instinto que eu devia fazer o contrário, mas como é que seria capaz de comer uma ovelhinha que precisava de mim? Até podia ficar com o coração partido…

A ovelhinha sorriu e atirou-se para as minhas patas.

– Estás com fome, enlatado? – perguntei, abanando a cauda timidamente. – Que tal uma sopinha de legumes?

 

Notas:

- Este conto é uma adaptação livre de “A Ovelhinha que Veio para Jantar”, de Steve Smallman, ilustrado por Joelle Dreidemy.

- No final desta versão revista e aumentada, decidi abrir um restaurante vegetariano com a ovelhinha, porque, afinal, a sopa de legumes não é assim tão má, desde que eu tenha companhia!

 

08
Jul24

O Outro Lado do Teste

 

Os sintomas eram febre, tosse e fadiga; ela desconfiou de imediato da COVID, especialmente porque ouvira as últimas notícias sobre o aumento de casos.

 

Sentia calafrios ao lembrar-se do contacto de risco que tivera. Decidiu ir à farmácia. Explicou a situação ao farmacêutico, que lhe entregou um teste para fazer em casa.

As instruções de uso eram claras, e o novo método de colheita da amostra revelou-se uma surpresa agradável, evitando aquela pressão incómoda nas narinas. Recolheu o material com cuidado, aplicou algumas gotas no dispositivo e esperou, ansiosa. O coração acelerado, cada segundo parecia uma eternidade enquanto a lembrança de relatos sobre complicações lhe inundavam a mente.

O teste processou rapidamente a informação, mostrando o resultado sem sombra de dúvida negativo. Sentiu um alívio imediato, pensando: “Pronta para a próxima!”

Só não esperava que o dispositivo medisse também as semanas de uma eventual gravidez.

 

10
Mai24

Disco Voador

Disco Voador.jpg

O OVNI, com algumas amolgadelas fruto das viagens intergalácticas, faz uma aproximação cuidadosa à oficina.

 

Os mecânicos, habilidosos e versados em tecnologia alienígena não baseada em combustíveis fósseis, exibem uma atitude calma e confiante ao inspecionarem o disco voador. Munidos de diversas ferramentas, circundam a nave, avaliando com olhos profissionais o que precisa de reparação. Embora reparar discos voadores não seja uma ocorrência diária, para estes mecânicos é apenas mais um trabalho idêntico a qualquer outro em que são altamente especializados.

Os vizinhos, já conhecedores de tais eventos, aproveitam o espetáculo. Com sorrisos e troca de olhares, comentam baixinho as peculiaridades do veículo e dos seus ocupantes.

Não muito longe, duas vacas mugem.

 

Foto de edifício em São Jorge, município de Alto Paraíso de Goiás, localizado no Planalto Central do Brasil. Autor desconhecido.

 

27
Abr24

Baba de Camelo

Baba de camelo.jpeg

Imagine-se um deserto vasto e dourado sob um céu implacavelmente claro. O por do sol começa a projetar longas sombras sobre as dunas, e o calor forte do dia deixa espaço a uma brisa mais fresca.

 

Uma caravana de camelos altivos avança lentamente pelas areias, cada um com o seu balancear elegante e tranquilo.

Entre os camelos, há uma equipa de chefs pasteleiros vestidos com túnicas coloridas e turbantes, equipados com pequenos baldes de cobre e espátulas de madeira exótica. Eles caminham com um propósito: acompanhando os animais com olhar atento, aguardam o momento perfeito para colher a sua preciosa baba, ingrediente secreto de uma sobremesa lendária.

À medida que os camelos param para descansar, um dos chefs aproxima-se cuidadosamente e, com um gesto hábil e respeitoso, recolhe o muco que brilha ao sol poente. Murmura então algumas palavras de reconhecimento ao ouvido do camelo, que, em resposta, simplesmente lhe pisca o olho, como quem aceita a importância da sua contribuição.

A baba, na realidade uma mistura de sabores raros e essências de frutas dos oásis, é levada para a tenda principal, onde será misturada com outros ingredientes naturais. Os chefs pasteleiros trabalham a noite toda sob a luz das estrelas, transformando o muco camélico em creme suave e aveludado.

Certo é que basta uma gota desta essência para fazer da sobremesa um prato digno de reis e rainhas, mas ainda assim acessível a pessoas de todos os extratos sociais.

 

23
Abr24

Bateram-me à Porta

Bateram-me à porta.jpg

Ele, de meia-idade, com cabelo ainda preto e uma expressão pensativa, vestia um fato sóbrio, também preto, grande demais para o corpo, a gola do casaco pendurada.

 

O pescoço, ligeiramente curvado, refletia o peso da responsabilidade que parecia carregar, como se cada visita, cada cumprimento de porta em porta, fosse um ato de respeito e dever.

Ela, na casa dos 25 anos, apresentava-se com um vestido evasê intemporal, padrão pied de poule, abaixo do joelho, os sapatos de meio salto um pouco cambados. Eram, em comum, portadores de pastas de napa preta.

Disse o mais velho: “Vimos falar com o Senhor”.

Havia, em ambos, uma dignidade no porte e a postura de quem carrega o peso de uma causa.

Sorri e logo desbobinei o meu discurso n.º 2: “Dou-me e dar-me-ei sempre bem com todas as estrelas do firmamento e com os seus representantes na Terra”. Entendi usar de prudência: embora não ande atrás de nenhuma estrela em particular, nunca consegui esclarecer bem a que paraíso ou inferno poderei ir parar quando o sol escurecer e os figos verdes caírem, derrubados da figueira por qualquer terrível vendaval. É que, neste particular, as opiniões dividem-se…

Continuei sem rodeios: “Estou super-stressado, hoje tenho bué trabalho para fazer e pouco tempo para conversar, a menos que os Senhores queiram – o que é improvável – dar-me uma ajuda”.

Quando acabei, a mais jovem tomou a palavra, mantendo uma postura serena: “Nós somos os novos vizinhos do 5º andar!”

            

 

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